Acho que você sabe, eu sempre guardei uma
curiosidade infinita sobre os mistérios do mar. Eu sou dele, mestre. Eu me vejo
no horizonte e na parte invisível sob a imensidão azul, e nas ondas que se
quebram... Quebram-se, e voltam. Voltam e voltam diferentes do que foram,
cumprem seu destino e entregam suas conchas, deixam na areia da praia o que não
lhes cabe mais. Eu me lembro de vê-lo carregando sua bicicleta enquanto eu
cumpria um ritual com amigos, conchas e água salgada. O que eu sabia sobre você
apesar de ser pouco era o suficiente para sustentar meu interesse... “É ele? O
menino mágico?” Então a gente senta numa roda, e o mar quieto e sereno, se
despedindo do sol, recebendo a lua, presencia o que a gente chamou de
reencontro. Foi uma noite linda, menino coala, o nosso reencontro. Envolvia uma
quantidade tão bonita e numerosa de pessoas de espírito livre e bondoso,
contidos talvez, mas prestes a soltar a sabedoria que havia ali, guardada,
pronta pra ser instigada.
Não sou capaz de recordar uma passagem da minha
vida tão rica em conhecimento como o desenrolar dos nossos encontros. Era uma
coisa bonita, a sua essência. Minha estranheza andava de mãos dadas com
uma profunda admiração. Havia atemporalidade nos seus passos, e enquanto você
andava o destino ia se movendo como faíscas coloridas que se movem junto com o
vento, numa dança que desenha caminhos capazes de nos levar a lugares e pessoas
inesperadas. Nossos encontros eram assim, uma faísca brilhando na noite que
entrelaçava caminhos, e aí a gente se achava. “Olha aonde vai Peu!” Jeito
bonito de se encontrar... De ser encontrado.
Hoje eu sei que do que sou, há muito sobre o
que fomos. Sobre o nosso reencontro! Minhas palavras são fortemente dirigidas a
você, por pura gratidão e amor. Amor porque a partir de você mais laços foram
feitos, e a nossa tribo, me representa. E de tão distintos, eu sei, a gente se
pertence sem a menor pretensão de ser dono do outro. É uma amizade pura, laço
de alma, de espírito. E o nosso acontecimento em conjunto não é obra única do
acaso, é a sintonia do destino. Nossos passos trilhavam os mesmos caminhos e o
coração beirava o mesmo precipício. Vocês me fizeram especial.
Eu olho em volta, mestre, e vejo que o tempo
presente é uma prova: Preciso aplicar toda a teoria que aprendi com você. Houve
uma troca intensa de conhecimentos e aprendizagens, um momento riquíssimo em
amor que sustentaria toda a saudade. Eu me lembro, de quando você me disse em
uma das noites mais assustadoras da minha vida, “Medo é ilusão, pequena, vai
passar”. Além de cuspir cartas e fazer coisas desaparecerem, você tem o dom de
me acalmar. Por isso no instante que tenho em mãos, honro todas as
aprendizagens fazendo desaparecer o medo, a ilusão. A angústia que não é minha.
Foi com você, mestre, onde eu comecei a respeitar as minhas asas. Aprender que
laços não se quebram com a distância, e que o universo habita também dentro de nós.
São nas lembranças de dias e noites em frente ao nosso cúmplice, o mar, dias e
noites em boa companhia, uma roda de amigos. Saudade não é mais dor, sabia? A
minha saudade é pura gratidão. E eu sinto, num lugar aqui dentro, que ainda
vamos nos cruzar muitas e muitas vezes. As estradas também são nossas.
Estou vivendo na cidade onde o sol nasce
primeiro em toda América, sabia disso? E vou lhe contar que ando conhecendo
tanta gente de sorriso bonito! Tanta gente cheia de simpatia que conquistam no
dia a dia o meu encanto. Preciso lhe trazer aqui! A nossa tribo inteira. Apreciar
a imagem de Iemanjá em frente ao mar, diante de toda a cidade, e pedir que a
rainha dos mares nos dê ainda mais coragem e sabedoria. Preciso amanhecer com
vocês outra vez, e rechear meu coração com aquela luz e paz. Apreciar o
mistério do planeta... Vamos nos vestir de alegria, como sempre fizemos. Vamos
atravessar a ressaca, o mal tempo. Mesmo de longe, a gente se cuida. E vai
cuidando, porque é pra ser assim. Gratidão menino coala, eu também aprendi com
você, toda a minha gratidão pelo momento em que o destino resolveu nos colocar
outra vez, um na vida do outro.
Quando vejo o mar me lembro de tudo o que
senti, num dos anos mais bonitos. E o mar beija meus pés daqui, e beija o de vocês,
daí. Vai mandando minhas energias, meu afago... E eu vou aguardando com muita vontade, o momento em que nos veremos outra vez. Cuida-te! Obrigada pelo mundo que você me
apresentou, obrigada pelo livro que me entregou, pelo universo que construímos
(com tintas, Viajande!). Por ti, todo o meu carinho, admiração, respeito e
a-m-o-r! Por nós, pela tribo, pelos viajantes... Toda a fé, os pés descalços na
areia da praia, a coragem, a astúcia e a humildade. Fomos grandes enquanto estivemos
juntos. Nos tornamos gigantes pelo que construímos.
Com amor, e muita saudade,
A sua aprendiz.
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