domingo, 29 de janeiro de 2012



Jamais ousei abandonar o vestido de bolinhas, a franja desarrumada e o gosto pela beleza da praia na hora em que o sol beija o mar traçando cores belas que alcançam o horizonte. Em 1998 eu ainda era tão miúda e desentendida. Gosto de ouvir minha mãe contar histórias sobre as nossas viagens para casa de praia naqueles anos dourados. Ela sempre narra a minha agonia ao ficar dentro de casa, minhas pernas suplicavam para correr até o amar custe o que custar. E assim, ainda tão pequena, não havia um só capaz de me segurar pelos braços. Eu entendo que esse meu amor por uma vida leve com asas feitas de liberdade é quase um instinto, como algo que vem de dentro. Esta é a causa pela minha repulsa por prisões e paredes com cores cinzentas. Gosto de admirar as fotografias antigas, passo horas a fio virando as páginas dos álbuns que escondo no fundo da gaveta. Pego uma foto e a deixo entre as folhas de um livro que tenho devorado no momento. Marco a página e guardo a lembrança como quem guarda uma arca do tesouro. Nos traços eu vejo as marcas do tempo, as roupas em que não caibo mais. Eu tenho compreender, ainda que de maneira borrada, o compasso dessa vida feita de chegadas e despedidas: O vestido de bolinhas já não está mais pendurado no guarda-roupa e aquelas pessoas das fotografias já não são mais tão presentes. Há alguns anos eu lembro que havia cortes em meu corpo pequeno, eram marcas no joelho de uma garota levada e incrivelmente desastrada. Sempre fui passarinho desastrado. Mas agora as cicatrizes geradas por uma queda da árvore são substituídas pelas marcas da tristeza que compõe a minha alma. E mesmo pedindo a Deus para ser uma pessoa um pouco mesmo tristonha eu tenho a certeza de que eu jamais seria capaz de abandonar uma fração da minha melancolia. Mário Quintana estava certo ao dizer que a melancolia é uma maneira romântica de estar triste.

A gente cresce, se dói, se dá. Sem nem perceber já estamos entregue ao que ousamos chamar de vida, porém lhe confesso que o meu maior devaneio foi ter sido do mundo, antes de ser minha. Mas a gente aprende quando pega a borracha para apagar os erros e os próximos traços estão sempre mais próximos dos acertos. E ainda haverá curativos, mesmo que nos restem as cicatrizes. Aos poucos vou aprendendo a dizer adeus, mesmo quando uma parte de mim grita ódio por despedidas. Eu deixo a janela aberta para que o vento limpe o quarto e varra a minha alma. Vou virando saudade, lembrança, carinho. Vou crescendo e me tornando um pouco minha também. Eu acordo para a vida e a aceito sem eufemismos.

E mesmo assim, pesada e cheia de medos, posso me sentir leve como em uma tarde, no ano de 1998, andando pela praia... Ou melhor, correndo e pedindo aos céus por um par de asas.

sábado, 28 de janeiro de 2012


Não importa aonde você parou, em que momento da vida você cansou. O que importa é que sempre é possível e necessário recomeçar. Recomeçar é dar uma chance a si mesmo, é renovar as esperanças na vida e o mais importante: acreditar em você de novo.
Carlos Drummond de Andrade
I don’t wanna stay here but I also don’t wanna go home. The world seems like a cold place and all I have is a heart scared. I was thinking about rain and how the sun is always late to open my eyes. I could take a brush to paint all the walls between me and the happiness. Some promises are going away with the wind and the winter is calling me at the door. I feel something screaming inside of me. I feel like I just have to let the life open my wings and so I’ll be able to see the life in a different way. I can say that I’m fine to some people that just appear in the middle of the day but my heart will be crying cause all he wants is tell the truth about his feelings. And now I feel like a miserable because if I could open the window the sun will be shining there, and the day is beautiful but I can’t share the happiness if all I have is afraid.

And I don’t wanna be afraid anymore.

We are getting old, but we don't learn too much.

domingo, 22 de janeiro de 2012


Epifanias

Eu gosto de ficar do lado de cá com as janelas abertas, gosto de ficar sozinha. São nesses momentos que eu deixo o vento entrar e bagunçar a casa inteira, eu deixo que leve os papéis sujos e as histórias que não foram contadas. Gosto desse silêncio no final da tarde porque eu me deito sobre o sofá e deixo a porta da varanda aberta: Eu gosto de olhar o modo com que o dia chega ao fim, e raramente nós nos damos conta de que este é só mais um começo. Agora a vida é destrinchada sob as estrelas e o luar. A gente pode soltar balões e perde-los para a solidão da noite da mesma forma com que perdemos nossas vidas diante das incertezas.

O encanto da infância está na inocência e na duração dos momentos. As lembranças consomem nossa mente e os anos já não passam de maneira tão lenta. A vida pula e a gente nem lembra mais de onde quer chegar; A gente só quer andar. Dar o próximo passo no escuro e ver onde isso vai dar. A ansiedade que um dia consumia as minhas madrugadas vai tornando-se algo mais calmo e até mesmo simplório, porque eu aprendi a deixar a vida cuidar um pouco de mim mesmo quando esses cuidados me deixam com marcas infindáveis. Eu sei que devorei um bom livro em uma tarde de sábado e acabei com vontade de pintar o quarto e deixar a vida um pouco mais bonita. Faz parte de mim essa mania de querer sempre saber mais e mais sobre o que nos move, meu pecado maior é deixar de viver enquanto deixo a vida me intrigar.

Eu quero fazer as pazes com o amor e com o meu jeito desengonçado. Eu levanto agora a bandeira branca para a tristeza e a deixo entrar, ofereço aconchego e um pouco de café amargo. Eu quero fazer as pazes com o meu encanto pela solidão. Quero fazer as pazes com o meu sorriso bobo e esse meu jeito fácil de deixar-se encantar. Quero também dizer olá para a saudade e conversar um pouco enquanto tomamos um pouco de chá... Queria lhe confessar de que estou farta de reclamar da falta, do que se foi, da ausência.

As razões eu vou deixando de lado e no fundo sei que nunca pedi por um pouco de sentido no meio de tanta desilusão. Não quero esquecer aquele amor de outras vidas e uma história. Eu vou atirar cartas por debaixo das portas deixando um pouco dos meus segredos para trás. Vou correr pra ser do mundo e fazer do mundo o meu lar. Com a minha fé eu bordo a coragem, com alguns livros, um bocado de histórias e as canções eu nunca estarei só. Vou comprar um cartão postal na banquinha que fica de frente pro mar e escrever um pouco da minha aventura de menina. Não sei pra quem o enviarei, talvez o deixarei guardado entre as páginas de um livro bom. Eu gosto da história, e talvez, goste de guarda-la só pra mim.

Eu vou conhecendo dessas pessoas que possuem esse brilhinho especial e carregam um oceano nas pupilas. Vou escutar as histórias de um velho senhor que senta-se durante todas as tardes na varanda de uma casa grande, ele vai confessar a saudade de seus filhos e eu lhe falarei do quão grande é a minha família. E o quão longe estou de casa...

Da vida, sei bem o que eu quero. Mesmo quando o que eu quero não é algo muito claro e só vem a exibir-se quando entro em contato. Eu vou fazer as pazes com um coração surrado que bate aqui dentro e vou tentar não tropeçar nas mesmas pedras. Vou dançar debaixo da chuva enquanto ando por uma cidade grande. Quero abandonar o medo numa caixa velha e deixá-lo adormecer... Quero menos prisões, e só liberdade.
With love we sleep with doubt
The viscious circle turn and turns
Without you i cannot live,
Forgive the yearning burning
I believe in time too real to feel
So take me now, take me now, take me now

Because the night belongs to lovers
Because the night belongs to lust
Because the night belongs to lovers
Because the night belongs to us

Patti Smith
Because the Night

sábado, 21 de janeiro de 2012


"(...) Não sei lidar com algo que pode nos roubar de nós mesmos."

Eu não costumo pensar muito sobre a morte, mas quando estes pensamentos me agarram torna-se um pouco difícil desviar a mente para um outro assunto qualquer. Nunca fui de usar a racionalidade, medir as consequências dos atos. Da mesma forma que algumas palavras pulam pela minha boca eu simplesmente me entrego à vida de tal maneira que não consigo e não quero compreender o porquê de um final tão desesperadamente trágico. A vida soa como um filme interrompido, um ponto final que consome toda uma história em fração de segundos. O que há do outro lado sabemos muito pouco, mas é difícil imaginar um lugar tão mágico e ao mesmo tempo desesperador quanto o nosso lar no mundo. A morte nos vem e nos engole como um buraco negro perdido no universo. Não há nada a ser feito ou proclamado: A nossa vida, durante um único e breve instante, resume-se ao brilho de um olhar. É difícil imaginar a dor de perder um alguém que tenha cavado um lugar tão profundo dentro do seu coração: É como perder para a morte um pedaço de si – talvez a parte mais bonita que se cultivava dentro do próprio peito. Já ouvi dizer que não há como acabar com a dor, é algo que a gente aprende a lidar com a ajuda do tempo, das horas e dos dias.

Eu me perco no momento inicial, na hora em que descubro que o coração daquela pessoa já não bate mais. Nós deixamos de sentir e de sonhar. Lembro de quando eu era pequena e lidava com a morte de uma maneira mais inocente e menos dolorosa: As almas, em meu mundo pequeno, eram convertidas em anjos... Nós nos tornaríamos invisíveis e brotariam asas brancas em nossas costas, voaríamos para cuidar bem de quem ainda estivesse diante das desventuras da vida. No entanto, um pouco crescida eu não consigo encarar a morte de uma maneira tão leve e sábia. Com sete anos eu ainda era capaz de suportar o que hoje me parece uma interrupção inexplicável até para aqueles que já desfrutaram 100 anos.

Eu ouvi o relato de um acidente de carro. Uma família. Um pai amoroso, entretanto um pouco bêbado e sem noção de velocidade. Uma mãe preocupada. Dois filhos jovens e inocentes olhando o mundo pela janela sentados no banco de trás. Um certo descontrole, foi tudo o que foi preciso para a morte e os corvos terem a sua hora: Um carro capotado e já não havia mais família. O pai estava intacto, a mãe muito ferida. Os filhos? Já não sentiam o coração pulsar e o sangue correr nas veias. Foram minutos inconvenientes e um mundo que para aquelas pessoas deixou de existir. O pai está louco, não há palavra melhor que possa defini-lo. A mãe mesmo dilacerada por dentro queria só mais um instante; ver os corpos dos meninos. Nos apegamos ao que é palpável, mas eles já não estavam mais lá. Pela primeira vez eu suplico por um pouco de racionalidade: Onde há razão na ausência do suspiro da vida? O que nós somos? Não sou capaz de compreender esse conceito banal sobre a nossa jornada: O começo, meio e fim.

O corpo nos consome por dentro e a vida nos prega peças. Mas o que somos quando comparados aos estragados que o mundo pode nos acarretar? Quem somos nós diante do véu negro que cobre a morte? O suspiro final, o coração quebrado e os sonhos abandonados. A morte ainda não faz sentido no meu coração. Mesmo quando eu vivo suspirando dramas não sou capaz de lidar com a presença de algo que pode nos roubar de nós mesmo.

Mas quem sabe não seja melhor voltar a pensar como uma garotinha de sete anos: A morte seria menos pesada, e poderia até aderir tons mais claros. Seria apenas o começo de uma jornada como anjos. A recompensa por tantas dores em uma única vida.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Eu não gosto de ouvir as dores por detrás da porta assim como não gosto de reparar na esperança despedaçando-se sob meus olhos. O corpo entorpece e pede um pouco de vida ou até mesmo de coragem. Dá medo encarar tantas desventuras e descobrir que depois de tanto tempo quebrando-se contra o chão sua alma ainda está inteira. Inteira, eu digo, costurada. A gente nunca é o mesmo depois das tempestades, não adianta pedir por um pouco mais de força ou controle porque a tristeza ainda sim é como a imensidão do oceano: Nos engole. É como um mergulho profundo onde não é fácil retornar a superfície para encher os pulmões com uma nova golada de ar. O mundo não facilita o momento em que juntamos os trapos, o tempo continua a passar e eu nunca fui muito presa aos relógios.

Eu queria viver da arte e poder fazer do mundo que me soterrou algo que intrigasse os demais. A vida, na sua maneira mais crua, mais natural e selvagem. Sem eufemismos e sussurros. São gritos altos que borram a tela branca com tintas pretas, são marcas deixadas pelas paredes, e uma camiseta coberta de suor sobre o sofá velho que compõe a sala. São os extremos, as agonias, o que corrói por dentro e nos consome. A vida nos tira esperanças e as devolve sem pedir licença ou desculpas.

Às vezes eu consigo enxergar a mim mesma como uma fingidora: Porque eu engulo cada pensamento e cada tristeza. Eu engulo porque não acho que sou merecedora de qualquer crédito ou regalia. Não me deram direito de voz e eu não me acho no direito de ferir alguém com uma palavra leviana solta ao vento. Eu não quero transformar a minha tristeza em espinhos que venham a ferir quem me deseja bom dia, eu não posso deixar. A minha tristeza é uma sombra que percorre o meu passado e vem assombrando os meus dias atuais, são culpas e dúvidas, perguntas que mesmo depois de anos continuam sem resposta. Foram desventuras impostas sobre as minhas costas e ninguém perguntou se eu era capaz de aguentar. Eu ainda era miúda e gostava de sonhar acordada, foram cruéis e me derrubaram das nuvens. “Ei, menina, esse mundo não é só algodão doce e finais felizes

Não precisava ter sido daquele jeito e eu não quero carregar este fardo pelo resto dos meus dias. Eu não quero ouvir a dor que ecoa no quarto ao lado. Procuro entre as minhas lembranças algum sinal que de tão simplório tenha passado despercebido: Eu quero ter a certeza que posso carregar esse peso sozinha, mas antes de qualquer coisa, eu queria engolir a dor que tira o sono e calma do quarto ao lado.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012


Eu juro que queria entender um pouco mais sobre o seu jeito de andar como quem vive feita para dançar. É o encanto que a envolve de maneira sincera que me deixa mais intrigada, M. Nunca soube muita coisa sobre você, mas sempre tive a certeza que este mundo não é tão grande ao ponto de prender seus pés no chão. Talvez seja a dança que tenha lhe ensinado a saltitar levemente... Vou lhe confessar que me senti honrada por poder catar pedaços do seu mundo, eu vou construindo você com a calma de quem monta um imenso quebra-cabeça. Cada pedacinho que encontro e descubro é como um mar de encanto envolvente que me instiga a querer saber sempre um pouco mais. Você parece como um livro que nos engole e conforme as páginas são viradas, o mistério seguinte é sempre um calabouço sem fim. Entre margens pretas eu vejo estrelas, são as surpresas que você nos oferece com uma boa dose de gargalhada. Qualquer dia desses eu gostaria de entrar um pouco mais no seu mundo, está bem? Pode ser preto e branco com o James Dean, ou até mesmo entre um ato contagiante que lhe deixe empolgada diante de Chicago. Esses atos viram lembranças pra uma caixa verde que tenho guardada, e eu vou lembrar sempre de você enquanto estiver lendo um poema escrito pelo grande Fernando Pessoa. Não posso me dar ao luxo de imaginar sua companhia nos próximos três anos, por isso eu vou guardando seus rastros pra quando a saudade apertar. Entrar na sua vida é como esperar quieta olhando pelo buraco da fechadura: Vem um brilho de lá de dentro, e a gente precisa tocar um pouco mais. Quando nos damos conta estamos do outro lado da porta dançando mesmo quando nossas pernas estão cansadas. E mesmo quando você tenta se esconder ainda há um brilho. É impossível ofusca-la quando há um mundo que se assemelha ao conto mais envolvente que já fora lido.

Eu posso lhe pedir para me guardar um pouco aí dentro? Para você lembrar de mim quando estiver andando pelas ruas de Londres ou ouvir soar o toque do Big Bang. Vou pedir que os ventos lhe levem para longe, e que aos poucos, você possa começar a se entregar verdadeiramente. Entregar-se para a vida da mesma forma que se entrega para a arte. Você é a bailarina que a vida escolheu para levar encanto para o mundo, e estou grata por ter dançado um pouco mais com você. Quem sabe um dia eu lhe escrava uma carta para que você possa ler sentada na varanda de uma casa em Paris? Podemos marcar um encontro, quem sabe Itália, não é mesmo?
(...) Eu costumo dizer que a vida brinca de se renovar nos convidando para descobrir um outrem dentro de nós mesmo. É como dançar em ritmos diferentes, mas sempre com as mesmas sapatilhas. Existe uma porção de gente lá fora que brilha diferente, anda como se estivesse dançando e tem olhar de quem esconde mil segredos. A parte triste da história é que quem brilha geralmente esconde-se debaixo das próprias armas, e isso é difícil de entender. Mas confesso, a graça da vida são os segredos, aquela parte do mundo que só a gente é capaz de enxergar.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012


(...)

Take me out tonight
Oh take me anywhere
I don't care, I don't care, I don't care
And in the darkened underpass
I thought "Oh God, my chance has come at last"
But then a strange fear gripped me
And I just couldn't ask


The Smiths;
There is a light that never goes out

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Não sei em que momento nós passamos a deixar os sonhos de lado, e apesar de não lembrar com clareza qual foi o ponto sobre nós dois que passou despercebido, eu não deixo de temer a ausência das vozes na madrugada, os planos deixados para trás.

Eu digo que tenho medo de perder, mas você já foi embora faz muito tempo. Por favor, não me culpe por desistir. Entenda que eu não tive escolha, suas palavras foram vazias e meu coração não consegue manter-se inteiro quando já não há encanto. Não ouse duvidar do que há aqui dentro, e do que sinto quando as pessoas perguntam sobre nós dois. Ainda dói não ter resposta, ainda dói ter que abaixar a cabeça e tentar espantar as lembranças que construímos. Chega um ponto em que se torna difícil acreditar quando já não há um retorno. Nós dois sabemos o quão crucial é a sinceridade diante das nossas circunstâncias; eu não posso tentar compreender o seu mundo através do brilho dos seus olhos ou do jeito desconcertado dos seus gestos. A gente sonhou que ganharia o mundo, que seria eterno. A gente não sabia muita coisa, só conhecia as borboletas no estômago, as confissões pela madrugada, e a dor da saudade. Eu não posso chama-lo para mais uma conversa, mais uma tentativa. As frases miúdas não são o suficiente e eu não posso lutar contra elas.

E quantas cartas de despedidas serão necessárias para nos conceder a decisão ainda que dolorosa do ponto final? A partir de que momento nós poderemos seguir em frente sem machucar um ao outro? Nós fomos uma margem borrada de tudo aquilo que jamais poderíamos ser, e chegar a esta conclusão é como matar metade daquilo que me estendia de pé. Até que ponto as ilusões serão a maior parte do que existe entre nós? Até quando eu sentirei vontade de lhe telefonar e pedir que fale um pouco mais... Me conte um pouco sobre o seu dia, sua família, seus medos e sobre o nosso amor. Quero ouvi-lo dizer que me amar, nem que esta seja a última vez. Dois anos não são dois dias. Dois anos foram uma vida... Uma vida que foi nossa mesmo com tantos intervalos. Foi um pedacinho meu que permanecerá com você eternamente, um pedacinho seu que eu guardarei até o fim dos meus dias.

Só a gente sabe como foi difícil, como as pernas tremeram, o sono foi espantado. Mas a gente também sabe o quão encantador foram os nossos sonhos; Uma passagem para o mundo distante, um lugar que pudesse sustentar a nós dois, nossa presença mesclada em um amor que nos tornaria únicos. A gente se achava especial, traçados por um amor que jamais alguém fora capaz de ouvir falar, e que nós dois não ousaríamos contar. Era uma história nossa. Triste, mas nossa. Os verbos vão se conjugando no passado e a saudade senta ao meu lado e pede um café amargo. Vou lembrar de você quando a vida apertar e eu me por a chorar. Vou amar você quando o céu estiver limpo e vida brotando colorida feito flores de esperança.

O eterno, eu aprendi, é o que fica guardado e sobrevive até mesmo diante da ausência.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012


As flores que enfeitavam as janelas estão murchas e o céu não parece tão bonito. Eu queria ter um pouco mais de graça e de calma. A vida vai se destrinchando aos poucos, os nós são desfeitos, mas eu sinto como se ainda houvesse um mundo inteiro enterrado no porão. Em algum momento no meio da agonia eu fiquei presa entre os escombros do que fui um dia. Minha boca prende e o coração não se permite ser revelado. Tentei dizer que andei me aceitando por inteira e descobrindo o que era a força por detrás dos cacos de vidros espalhados pelo chão, mas a verdade é que eu não consigo entender o porquê de tantas desventuras em um único conto. Ninguém é capaz de parar por um único segundo e olhar sobre todas as mágoas que formam essa neblina. A gente não consegue porque a dor vendou os olhos, e nossas pernas não são fortes o suficiente para nos sustentar. Eu me sinto velha, mas nem um pouco mais sábia. A vida passa escorregando por entre os meus dedos e eu acabo não sendo capaz de segurar os momentos de euforia; meu coração só prende a melancolia, o que não foi dito e nem sonhado. O que não acontece também deixa marcas, e na grande maioria das vezes estas são as mais profundas e agoniantes. As palavras ficam presas em um espeço do tempo em que os verbos não podem ser conjugados, a vida em si não pode ser pronunciada. A gente vai guardando um mundo de suposições sobre como seria se houvéssemos tomado a decisão certa, e eu nunca tive muita sorte nas minhas decisões. Estamos fadados às suposições, presos pela ausência do nosso próprio corpo.

Eu estava sentada na poltrona vermelha, mas meus olhos estavam presos ao que poderia acontecer se eu estivesse do outro lado da porta.

Confesso que eu poderia aceitar facilmente um convite para fugir do que nos é imposto. Eu me encolho na busca por uma fechadura, uma espécie de portal. A vida perde o gosto e as cores quando o encanto vira fardo. A gente continua sem respostas e não desiste de enfrentar o que há no amanhã. Agora que aprendi a vestir diferentes tipos de armaduras eu não me concedo ao luxo de desistir, continuo de pé. Vai em frente, caminha, encara. O medo vai se escondendo nas estranhas e deixar de virar obstáculo para ser adversário derrotado. Entretanto, eu não aguento ver tanto corpo pra pouca alma. Tanta alma pra pouco coração. Eles me disseram que seu coração havia parado de bater, mas você não merecia. O sopro da vida não pode deixar de ser concedido aos anjos que pintam arco-íris e colhem flores pelo jardim.

Entre tantas desventuras, só espero não perder o dom do encanto.

domingo, 15 de janeiro de 2012

Por que a literatura é tão importante para a psicanálise, para nela se fundirem seus conceitos essenciais?

"Se toda arte é fotografia, logo a arte é esta revelação de algo não sabido e que, no entanto, estava ali. A literatura é capaz de revelar algo invisível para a psicanálise, como uma espécie de lente de aumento. É isso que permite dizer que a psicanálise também é uma leitura do ser humano que a literatura desenha em caracteres mais ou menos cifrados. O dito de que 'para um bom leitor meia palavra basta' vale aqui para as duas esferas. Problema tanto da psicanálise quanto da literatura é que bons leitores são raros"

Marcia Tiburi;
Filósofa e colunista da Cult.

sábado, 14 de janeiro de 2012

Para dias como hoje, não existem palavras. Tudo é medo e silêncio.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

"Nunca me esquecerei das crianças cujos corpos eu vi se transformarem em volutas sob um céu azul e mudo. Nunca me esquecerei daquelas chamas que consumiram minha fé para sempre. Nunca me esquecerei daquele silêncio noturno que me privou poda a eternidade do desejo de viver. Nunca me esquecerei daqueles momentos que assassinaram meu Deus, minha alma e meus sonhos, que se tornaram deserto. Nunca me esquecerei daquilo, mesmo que eu seja condenado a viver tanto tempo quanto o próprio Deus. Nunca."

Elie Wisel em A noite;
A experiência do autor quando menino nos campos de concentração.

E afinal, quanto tempo dura o que é eterno?
Eu nem sabia o que era eternidade e ainda assim ousava falar que seríamos para sempre.

Só não ouse se afastar, Sofia.

Nós decoramos as janelas da casa com flores e confesso que estou ansiosa para saber qual será a sua flor favorita. A gente precisa que você lute para abrir os olhos e chorar um pouco. Há um mar de pessoas aqui do lado de fora que querem vê-la dando os primeiros passos, eu serei aquela que irá segurar a sua mão e tentarei não deixa-la cair. Vou te ensinar a pronunciar o meu nome e vou ficar impaciente enquanto a coloco para dormir.

Você está dormindo agora, não é mesmo? Eu fico escrevendo as suas cartas como quem espera que um anjo as entregue para você. Eu quero que você saiba que nós precisamos sentir seu corpo pequeno em nossos braços. Você pode preparar o seu ninho enroscando-se nos cobertores, e eu juro que nenhum barulho estranho fará com que você se assuste. Quando você chegar a gente pode se divertir enquanto olhamos as nuvens... Eu sempre gostei de imaginá-las como figuras, posso até jurar que já vi dragões, tartarugas e imensas borboletas. É como ter um livro cheio de figuras sobre as nossas cabeças. E quando as tempestades tomarem conta dos dias a gente pode montar barracas com os cobertores e travesseiros, a gente pode até ler um monte de histórias e você poderá até criar a sua, princesa Sofia. Quando o céu estiver limpo teremos uma recompensa: Um belo arco-íris. É todo colorido, Sofia. É lindo, lindo. Dizem que do outro lado esconde-se um grande pote de ouro, mas eu tenho mesmo é vontade de conhecer os duendes que o protegem. Quem sabe você não encontre uma fadinha pra chamar de sua?

Dizem por aí que o sopro da vida exige preços muito altos a serem pagos, mas eu queria ter a oportunidade de mostra-la que nem tudo ainda está perdido. Você ainda é apenas como um grão de feijão e mesmo tão miúda já precisa ter força... Sabe a tempestade sobre a qual eu comentei? Estas são bastante semelhantes com as desventuras das nossas vidas, mas o arco-íris também existe no final das contas, e mesmo com ou sem o pote de ouro e todos os duendes, já nos vale o esforço e agora podemos contemplar as belas cores. Tudo acaba tornando-se uma questão de tempo e de fé. Eu, por exemplo, espero pacientemente pela sua chegada e tenho muita fé que lhe será concedido o sopro da vida.

Eu não consigo enxergar nada de ruim quando penso que você ainda tem a chance de nascer. As vezes a vida nos rouba algumas coisas, mas a felicidade é um caminho que pode ser percorrido por qualquer um de nós, mesmo com todas as tempestades. E você já é tão especial que possui flores na janela e uma família que já lhe deve o coração. Você é amada, Sofia. Ainda como uma sementinha, você é regada com um amor infinito, e eu preciso acreditar que a vida lhe dará a chance de tentar. Nós estaremos aqui com você e por você. Dia 16 nos surpreenda e diga que podemos esperar para vê-la enroscada em cobertores com roupinhas cor-de-rosa e fitas esperando para serem presas em seus cabelos. Vem, Sofia. Por favor, só não ouse se afastar.

Com carinho,
Alguém que lhe quer muitíssimo bem.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012


E no fundo eu só queria ter a certeza de que nasci para contar histórias.
Eu me permiti ser leviana quando aleguei que já sabia onde estava entrando. Na verdade, eu nunca soube. Criar mundos e cravá-los no meu futuro se tornou uma tarefa fácil, e até mesmo rotineira. Você sabe que eu sempre defendi a ideia de que plantar sonhos era algo fundamental, só que eu me esqueci de pregar o quão importante é regar as sementes que jogamos no chão. Joguei a culpa no tempo, no destino, no acaso... E no final das contas eu nem sei muito bem se estes possuem relevância. Esqueci-me de lembrar que o tempo pode trabalhar ao meu favor, desde que eu possa tomar as decisões certas. Entretanto, há muita coisa em jogo aqui. Livrei das minhas mãos a responsabilidade de carregar corações, eu não suporto ser a culpada pela ferida de outro alguém. Andei contando meus passos como quem conta migalhas, tentei jogar fora do caminho as pedrinhas que tentaram me pregar peças, mas não é assim, tão fácil. Eu sei, você sabe. A vida exige de nós um mundo de sensações que até então desconhecíamos. Eu sempre lhe disse que instigar situações inusitadas era realmente válido. São os momentos que me foram dados que fizeram com que eu pudesse conhecer uma vírgula do que é a imensidão que se esconde por trás da nossa carcaça. A alma vai além disso tudo e não precisa ser palpável para ser real. Lembro que alguém já dissera: “O essencial é invisível aos olhos.”

Suponho que o meu maior medo seja descobrir entre as imensidões, o abismo. A ausência da luz nos consome... Nos cega. Não sei lidar muito bem com os erros que cometo, tampouco com as peças que a vida me prega. Eu conheço das artes dramáticas, sou feita de uma delas, mas não sou confiável quando exigem a minha atuação. Eu não sei ser outra figura, eu não sei usar máscaras. Eu gosto mesmo das entrelinhas que confessa para poucos que meus sentimentos não são tão óbvios quanto a minha testa lhes diz. Eu sou transparente, mas não sou decifrável. Eu mesma não me entendo, e ao meu respeito sei muito pouco.

A parte engraçada no meio disso tudo é que eu gosto de tentar traduzir as pessoas, e eu mesma estou inclusa neste plural. Vou tentando decifrar as minhas noites em claro, as minhas conversas com o céu, e essa minha mania de querer andar na ponta dos pés – já cheguei a pensar que quero tocar as nuvens. Metade de mim é aquilo que quer engolir as dores do mundo, mas que em contrapartida não consegue lidar nem com os próprios sufocos. A outra metade é aquilo que tem medo, que erra, que chora, que por vezes, implora por um pouco de tristeza, mas que nunca nega uma boa dose de inspiração.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012




Eu não sei muito bem como consegui chegar aqui só sei que existem mistérios que pairam sobre a linha do nosso tempo. Eu acordei como se houvesse voltado quatro anos atrás e a mobilha estava completamente fora do lugar. Não tínhamos a pretensão de descobrir quem realmente nós éramos, a gente só brincava de viver e não complicava as perguntas. Na verdade, nem se quer havia perguntas. Era tudo muito simples e até mesmo colorido... Os cumprimentos eram naturais, os abraços eram espontâneos, e não havia um único fardo a ser carregado. A gente não sabia, mas aquele jardim ainda fazia parte da nossa infância.

Os laços foram criados com o passar dos dias, dos apertos, das desventuras. Quando a gente menos esperava já fazia uso do ombro alheio: Era a vida começando a bater na nossa porta, o medo começando a criar asas para lutar contra a liberdade da nossa alma. A gente cresceu e aos poucos, nos perdemos. Como qualquer outra estrada, a nossa também possui curvas perigosas, trilhas intimidantes e até mesmo sedutoras. Não sei bem qual foi o nosso erro, talvez inocência em demasia. A gente acreditou com tanta força no para sempre que deixamos de lutar por ele. É contraditório, eu sei. Suponho que em algum momento passou pela nossa cabeça que a vida trataria por si só de fazer o eterno acontecer... Este foi só mais um dos nossos erros. A gente acorda pela manhã e busca na memória os nossos primeiros dias, nos esbarramos no corredor e conversamos sobre as matérias difíceis, o coração que foi quebrado, o encontro que não marcamos, mas nunca falamos da saudade. Nunca tocamos no nome da falta, do que virou lembrança. A gente nem toca mais na vida do outro com medo de fazer alguma bagunça. O tempo não é responsável pelas mudanças ou pelos laços quebrados, o tempo só lutou contra os momentos que desfrutamos juntos... Infelizmente nós esquecemos de vestir as nossas armaduras, e deixamos tudo passar.

Mas a gente também aprende um bocado com tantos erros. A gente descobriu um tipo de eternidade que fica grudada no coração e não nos permite abandonar os dias de verão. Crescemos de jeitos diferentes e aos poucos, mesmo sem saber, fomos construindo o nosso caminho. Não é para ser triste, e mesmo que seja, temos que admitir a beleza. Por um momento do passado nós pensamos que fosse eterno: E talvez seja, só que dentro do coração de cada um. E que fique na lembrança, como um dia bonito, quando nos conhecemos. Quando entramos naquela sala estranha com luzes brancas, nos levantamos e ficamos de mãos dadas. Pronunciamos os nossos nomes em voz alta e lembro do sorriso de cada um que se confundia com o medo que fazia nossos olhos fitarem o chão. Medo só do desconhecido, do que ainda não foi tocado ou despertado. Não sei se foi o aperto de mão, as risadas agradáveis, o gosto maravilhoso do que ainda é novo e cheio de sonhos; Eu não sei em qual parte passamos a fazer parte um da vida do outro, temo ter deixado escapar o detalhe mais bonito. A gente vai deixar guardado e vai contar histórias, vamos olhar as fotografias e encher os olhos com lágrimas de saudade. Vai ser eterno mesmo depois do fim. Ainda vai ser amor e amizade quando for tecendo as palavras de uma história bonita demais para ser contada.

Ps: Qualquer dia desses podemos voltar para 2008, podemos dar as mãos e dizer nossos nomes em voz alta. A gente pode falar um pouco sobre a falta, sobre a saudade. A gente pode até conquistar o tempo que nunca foi nosso.