sexta-feira, 16 de dezembro de 2011




Querido Ryan,

Passaram-se duas semanas desde que você selou meus lábios em um beijo de despedida e a sua ausência pesa como se você houvesse partido há anos. Cinco dias atrás recebi uma carta com teu nome, mas escrita por outras mãos. Depois desta carta sinto o peso da sua ausência como uma eternidade. Eles roubaram você de mim, e eu ainda não consigo compreender boa parte desta desventura. Esse amor patriota impregnado em seus fardamentos não era seu, mas eles o fizeram acreditar que era. Mas que pátria é esta que nos rouba os amores mais verdadeiros, e nos deixam amputados: Sem parte do coração e da vida. Sem você, Ryan.

Como você sabe a nossa Rosie fez sete anos na semana passada. Este foi o primeiro dos próximos cem aniversários que ela fará sem tê-lo por perto. Não senti vontade de comemorar o aniversário da nossa filha, e me sinto horrível por isso. Conseguir lidar com balões coloridos e alegres na sua ausência foi algo extremamente difícil. A Rosie acabou de perder seu primeiro dentinho de leite, e ficou feliz em puxá-lo. Nossa garotinha é muito corajosa, certamente puxou ao pai. Ela estava ansiosa para lhe mostrar a janelinha em um sorriso. Passar para ela a notícia que vinha na carta do exército foi algo tão difícil quanto ler a mesma. Senti que as minhas palavras pouco a pouco roubavam da Rosie a parte mais bonita do seu mundo; a presença do seu pai. Nós choramos muito. Ainda assim ela foi mais adulta do que a própria mãe, e entendeu que você estaria olhando para nós lá do céu, e que não deveríamos chorar tanto, pois você ficaria triste. Estou orgulhosa da nossa filha. Mas ontem eu a encontrei dentro do seu guarda-roupa, enlaçada com suas vestes e segurando seu gorro com as pequenas mãos trêmulas. Aquilo me partiu o coração. Quando eu lhe perguntei por que ela estava ali dentro, ela me disse: “Estou escondida, mamãe. Não quero que o papai me veja chorando, porque ele pode ficar triste. Mas eu estava com vontade de chorar porque estou com saudades, então resolvi chorar escondida.” Não consegui lhe responder com uma única palavra, apenas me sentei junto a ela, e choramos juntas.

Além de sentir a tristeza, estou tomada por uma raiva estranha, Ryan. Fico pensando que talvez você ainda pudesse estar aqui. Nós deveríamos ter nos mudado quando você cogitou. Este país, esta prática… Esta na qual eu plantei a nossa vida, e reguei com cuidado por anos a fio, e que em certo momento nos ofereceu segurança, me traiu. Na carta que me enviaram tentaram dizer que apesar da perda, a sua missão foi algo grandioso no meio da guerra. Mas, Ryan, eu sentei na cama como de costume, esperando você sair do banho… Mas você não saiu. Você me beijou na porta da nossa casa, e abraçou a nossa filha. Estávamos nos despedindo e nem sabíamos. A esperança de vê-lo voltar para casa era o que estava me mantendo de pé. Agora eu peço que alguém venha e me explique o que há de tão grandioso nesta guerra que engole nossas famílias sem pedir licença. Não é amor pela pátria, meu querido. Desculpe-me por pensar desta forma, mas o que rege uma guerra são o ódio e a ilusão. (…) Eu gostaria de tê-lo em casa para me dizer que estou falando bobagens, mesmo quando eu tenho certeza de que não estou.

Mamãe veio me visitar quando soube da sua partida. Eu estava desolada, então ela pediu para que lhe escrevesse esta carta. Segundo ela, esta é uma maneira de aliviar o peso que estou sentindo. Ainda não sei se está funcionando. Não se irrite por causa das letras borradas, são as minhas lágrimas. Estou tentando cicatrizar a ferida que estava sangrando, e ainda dói. Tenho que ser forte pela nossa filha, e por você também. Você sempre exigiu de mim uma força que eu não sabia que existia… Ela existe, e obrigada por tê-la instigado. Eu aprendi mil coisas com você, meu querido. Perguntaram-me sobre a dor que sinto, e eu não soube explicar. Sei que se me pedissem para escolher entre tê-lo conhecido e sentir a dor ou jamais tê-lo visto para estar isenta de qualquer vestígio de machucado, terei a certeza de que fiz a escolha certa quando puxei conversa com você na aula de ciências. Você e a Rosie foram as melhores coisas que já aconteceram em minha vida. Obrigada, meu único e grande amor. Você foi tão bondoso que ainda deixou uma parte de si aqui ao meu lado para me trazer força. Por ela eu vivo, e por ela eu luto. Por ti guardo o meu amor, e agora no fim desta carta sinto que mamãe estava certa. Vou mantê-lo vivo em minha memória e em meu coração. Haverá uma gaveta só para você, meu anjo vestido de herói.

Agora tenho apenas a saudade, a Rosie, e as nossas lembranças.

Te amarei eternamente, Ryan.

Com amor,

Tereza.

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